Abaixo você pode ler alguns textos críticos sobre o trabalho do artista. Para ler basta clicar no nome do crítico desejado.
Um fascinado pelas técnicas artísticas, discípulo atento de mestres clássicos, seja do desenho, da gravura em metal, pastel, aquarela, pintura, Gregório, apesar de sua extrema juventude, se desloca rapidamente de uma técnica para outra com inquietação constante, praticando mesmo várias experimentações técnicas simultaneamente. Essa necessidade compulsiva de trabalho, urgência vital de expressão, ou única alternativa para uma busca de equilíbrio pessoal, segundo depoimento do próprio artista, é, talvez, o que mais o distingue dentro de sua geração. Enquanto artistas jovens de hoje fazem incursões pelo conceitual ou “arte postal”, com esporádico e leva conhecimento de técnicas tradicionais, Gregório parte destas, e estas até o momento o fez saciado, num ritmo de produção raramente constatado em sua geração: hábil artesão-profissional, investigador permanente, insatisfeito constante. Dai o seu interesse como artista em desenvolvimento, em incessante reinicio.
Gregório Voyeur
Gregório prefere esvaziar os olhos humanos: prefere a obra feita pelos homens. Talvez para fugir de sentimentos complexos provocados pela convivência entre essa espécie, o amável pintor retrata a obra adormecida. O sonho é concreto, o cimento ata os dedos, prende as fibras vacilantes. A obra dos homens de fato é melhor do que seus criadores. As peripécias de Greg-Voyeur registram aquelas brumas que envolvem nossos pensamentos. A torre, que tanto poderia ser um viaduto, uma avenida, um simples luminoso, aparece como uma âncora: é porto. Greg tornou-se vigilante urbano: olho posto nas marquises, nos muros. Ao mesmo tempo pássaro e gato, folha e chuva: camaleão sólido. Viajante insólito.
O pintor que este ano ilustra o relatório do Unibanco, Gregório foi apresentado quando ainda no começo da sua brilhante carreira em nosso Museu, surpreendendo pelo realismo de seus “pastéis” de uma técnica apurada e segura: signo exato, emoção de signa, composição suadente. Os painéis deixavam notar um acento de polêmica, pois o vento dos tempos sopra mais para a não-objetividade que para o ver e reproduzir fatos e coisas como elas aparecem e como a comunicação contemporânea nos convida a considerar. Gregório e dessa turma de artistas que resistem no figurativo, direi acadêmico, para todos entenderem, tendência que vai marcando vitórias. Incumbido de ilustrar o relatório do Unibanco, o jovem se dedicou a compreender o mecanismo qua aciona o movimenta dos bancários e dos clientes, anotando sínteses de atividades através da observação e do desenho viva, as vezes pontilhando o singular que se descobre nos casos mais simples do cotidiano. O MASP expõe os originais do relatório com satisfação, frisando como as instituições financeiras podem servir-se da arte para ilustrar sua operosidade.
Através do tratamento dado aos pastéis, as aquarelas, a acrílica, procura modificar o real emprestando à realidade novas conotações, não só de ordem plástica, mas sobretudo psicológica. O importante para Gregório, é o clima que envolve as paisagens, os objetos, as pessoas. Nessa maneira de ver, reside a característica básica de Gregório, que alia ao tratamento realista da obra, virtualidades essencialmente líricas.
Mas o que é na verdade o fenômeno Gregório em si? Isento de invólucros e mistificações. Nas pinturas e aquarelas recentes esta patente uma verdade. O artista amadureceu. O seu mundo e junto com ele os meios de retrata-lo. E o sintoma dessa verdade está muito claro. Há um momento para certos pintores em que o prazer passa a substituir a tensão do construção pictórica. O receio pueril do lugar ao namoro pleno com a arte. O desconhecido já não é mais aterrador e o domínio da pintura deixa uma margem para o gozo sensual da cor da matéria. Sobra tempo para o devaneto com o objeto escolhido. Pois Gregório mostra essa satisfação, o sinal evidente de uma plenitude muito próxima. A sua técnica tornou-se tão fluente, que ela já não importa mais. É parte integrante e ocasional de um processo sem limitações de estilo nem de época. Neste processo, tanto a concepção plástica e a visualização são individuais, quanto a noção de suporte e de pintura são atemporais. Ele é apenas o repórter sensível do deu ambiente, que deixa aos outros a tarefa da leitura. O verdadeiro artista que tem obsessão em realização e premência em comunicar. Os momentos fragmenta dos nas telas não são novos. Assim como não são novas as paisagens, os homens, os animais que o ser humano já retratado. A parte interna da veda urbana, enfocada ali, praticamente igual em todos os lugares. Todavia, numa época plena de cerebralismos, esoterismos e abstrações, também é gratificante verificar o poder, o alcance e a vitalidade de domésticas anotações.
Sheila Leirner para o jornal O Estado de São Paulo
Sempre houve e há ainda, na verdade, na obra de Gregório, uma crônica de época, de um mal-estar de fim de século, que é o que lhe confere significado e eficácia, Neste sentido, aliás, ela é catártica, para o autor e para quem a contempla, num sentido mais aristotélico do que freudiano do termo. Além disso, ele lhe acrescentou, nos últimos anos, um elemento de experimentalidade, uma problematização no nível do suporte, que coincide, a meu ver, com o fato de ter criado um ateliê em Barcelona. Esta exposição presentifica e dimensiona tal experimentação. A Barcelona se deve, por exemplo, o usa nas obras novas, de pastilhas de vidro, um material freqüente na arquitetura da capital catalã; e à ausência periódica do Brasil talvez se deva uma estranha nostalgia, que aparece em evocações tridimensionais com um toque surrealizante, de … Tarsila, nossa poetisa da pintura pau-brasil!
Trecho de apresentação de Olivio Tavarez de Araujo
É uma pena que as exposições não possam mostrar tudo! Mas como eu vi vou falar. Lentamente foram passando desenhos, aquarelas, gravuras, pinturas, pastéis, anotações, pastas “secrétas” de desenhos eróticos, enfim, uma massa de trabalho que posso dizer, representa mais que o estro de um artista, mas um depoimento cuidadosamente observado e simbolizado sobre uma geração ainda não formada. Eu conhecia esta atitude, numa linhagem tradicional que vem lá de Hogarth, Daumier, e mais facilmente reconhecida Hopper, de homens que em um determinado momento de sua vida madura, apontaram acontecimentos de sua época que revelam no dramático desenvolvimento do quotidiano, todo o mistério existencial num impasse inexorável. Estes trabalhos se tornaram não somente história da arte, mas da civilização e especificamente de grupos humanos.
Trecho de apresentação da exposição Galeria Graffite (1975)
E o que mais admiramos nos trabalhos desse artista o clima intimista criado com belíssimas cores escuras e quentes: violetas, carmins, magentas, azuis violáceos, iluminados por brancos que adquirem um aspecto estranhamente gelado. Um “que” de Metafísico emana dos quadros para, logo depois, diluir-se numa realidade humanizada, porém solitária. Mas essa solidão nada tem da desesperada incomunicabilidade entre os seres. Sentimos na solidão inerente à obra de Gregório, uma procura propositada de instantes propícios ao “relax”, as meditações e às observações do que se passa em seu redor. É justamente através desse clima, que podemos perceber toda a capacidade criativa do artista sensível à forma por ela mesma, sem complicações, num “ver” que nos recorda Cézanne, quando dizia pintar “ses, petites sensations”.
Ernestina Karman para o jornal Folha da Tarde
A paisagem urbana intramuros e extramuros continua a fazer com que Gregório remeta a figura humana a uma situação de isolamento por todo um complexo de desejos. O próprio cenário urbano do artista é bem brasileiro e seu trabalho se personaliza ainda por uma indisfarçada carga de sensualidade, que é bem jovem, e, mais notável ainda por uma coragem de aceitar e exibir o seu mundo, que raramente é conquista e atitude dos jovens, a tragédia burguesa do Brasil dos 70 também redita-se na pintura do jovem.
Trecho do texto de Jayme Maurício para o jornal Última Hora
A arte de Gregório surgiu como forma de descoberta do seu ambiente urbano, com a luz azulada característica das ruas do centro de São Paulo. Pintor nato, Gregório vivenciou o ambiente como uma estrutura de cores e tons, antes que de formas e volumes. Não o fez porém com uma tendência abstracionista, mas exprimindo integralmente a sua visão poética de adolescente em busca de seu caminho no mundo. Dai seu êxito em revelar a poesia do cotidiano, numa paisagem sem horizonte e sem céu. Um dos pontos mais altos da sua criação artística é a descoberta da autenticidade do corpo, contraposta à máscara do rosto, expressão dos condicionamentos sociais.
Gregório, O romântico
Sua arte hiper-realista e lírica descreve São Paulo à noite A partir de 19 de maio, na sucursal carioca da Montesanti Galeria acha-se a exposição do escultor e gravador Gregório Gruber. Nessa individual o artista mostra paisagens urbanas da São Paulo noturna e retratos contemporâneos de grandes artistas como Sônia Braga, Elis Regina, Bruna Lombardi, Ney Matogrosso e Billie Holliday.
Foi em 1971 que Gregório iniciou sua carreira artística no Salão de Arte Moderna de São Paulo. A arte de Gregório aparentemente é classificação como sendo hiper-realista. Só aparentemente, porque atrás da frieza das telas em grande formato, o hiper se amolda pela poesia urbana, a São Paulo da garoa e dos arranha-céus à noite, São Paulo solitária, esconde-se na poesia, no lirismo que evoca a cidade parada – mas que não pode parar – nas noites frias de solidão. A técnica perfeita, quase fotográfica, com que é feita sua pintura, não deixa de ser envolvida pelos mistérios da noite, tampouco pela realidade imediata. São Paulo noturna é vista como uma cidade fantasmagórica, onde a névoa e a bruma lhe dão caráter de passado e solidão. Certamente ele aprendeu o ofício com seu pai, Mário Gruber, embora seus estilos sejam completamente diferentes. O tempo entre Mário e Gruber fluiu, São Paulo passou a ser centro da pintura no país, cresceu, encheu-se de arranha-céus e de multidões. O homem se tornou insignificante em face da desproporção da cidade. Feita em escala sobre-humana, a capital paulista transformou-se em megalópole. Com isso o paulista foi esmagado e desumanizado, tornou-se um ser que passou a existir, como todos os seus seres, preso no seu anonimato. É isso que Gregório quis exatamente expressar como conteúdo emocional de suas pinturas. Nessa visão original de São Paulo, Gregório tem como companheiros João Calixto e Sedim. Os três são hiper-realistas, amam a São Paulo da Garoa de Mário de Andrade. Mais que sua reprodução fotográfica, eles expressam a alma silenciosa das ruas, parques, avenidas e casarios na noite da capital paulista.
Mas Gregório é diferente: envolve a paisagem urbana em uma bruma, o que a torna triste e fantástica. Ele não pensa nos dias luminosos, no torvelinho das multidões, na cidade dos negócios e sim que no local em que predomina o pragmatismo da vida ainda cabe o calor dos pares que se encontram, dos dois seres que se escondem no semi-escuro das madrugadas. Isso porque o que interessa a Gregório é justamente o frio das madrugadas paulistas. Por isso eles se aquecem um no outro, se abraçam vestindo longos capotes. Há ainda outra faceta na exposição da Montesanti e na própria pintura de Gregório: a dos retratos e influências das artes passadas. Os retratos, como o de Sônia Braga, reúnem a interpretação fiel da artista, com as transformações necessárias a dar-lhe uma personalidade. É a Sônia Braga com alma, alegria, quase expressionista. Nos quadros de influência impressionista, como na Mulher do Sofá de Manet, a figura foi transcrita com perfeita exatidão. Mas, para dar-lhe vida, ele traçou um reticulado horizontal.
Sobre o jovem paulista Gregório já tive oportunidade de escrever varias vezes. Desde seu aparecimento, a cerca de 4 anos, ele se tornou um dos artistas de referencia obrigatória na arte brasileira de agora, especialmente no setor do desenho. O nosso desenhista costuma intensificar com peso irreal as luzes e sombras de cenários de seus ambientes paulistanos. Essa característica o manteve sempre a margem do rotulo de hiper realismo, a ele francamente inaplicável. As gravuras sobre zinco surpreendem pela maestria técnica que revelam um artista que pouco se mostrava nesse campo, elas intensificam a aparência fotográfica na extrema simplicidade, clareza e direiteza do registro. São secas e precisas no alvo.
Trecho da matéria do Jornal do Brasil, outubro de 76.
Acompanhar o olhar do artista O tema principal do trabalho criador de Gregório é o olhar. E certo que sendo ele um habitante da cidade (São Paulo), o qual vê ao seu redor, na rua, são automóveis, edifícios, postes, no interior da casa, os objetos e, nas pessoas, os gestos. Na cidade, como no apartamento, o olhar tem vôo curto e este exercício poético de liberdade , que é o olhar, de certa maneira, e tolhido – falta o campo ou a montanha, falta o bosque, falta o jardim, o quintal ou a varanda. Não podendo se perder em lonjuras, o olhar procura exercitar o detalhe. naquilo que por força da circunstância urbana encontra-se inevitavelmente perto, e, assim. a que ganha expressividade é a fusão de pequenos gestos e objetos – fumar. costurar, telefonar, tomar café, banhar-se, deitar ou sentar-me. retirar alguma coisa do interior de geladeira. As vezes, mais o objeto Que o gesto – a cadeira vazia, a televisão. Ou o contrário – a mão.
A pintura urbana de Gregório “Artista da ruas, dos recantos de toda hora, dos quartos e cozinhas, ele é pintor de São Paulo, com vastidões e minucias, com grandezas e ternuras, perante a solidão dos desencantos e desencontros. “É a pintura de um caminhante nas noites dos nossos dias. As coisas, os objetos, parecem nele encontrar o silencioso desejo de permanecer, Máquinas, edifícios, móveis, figuras as dispostas para o esquecimento, têm ali uma irrefutável presença. “Há uma inquietante tensão um verdadeiro comprometimento entre o meio como coisa de fora e a luz como projeção de dentro. É essa luz conduzida pela sensibilidade de Gregório que cria, diante da perplexidade intransponível e coercitiva do cotidiano, um novo espaço, novas formas de interessar e recobrir as superfícies, de humanizar todos os vazios. “Assim, Gregório sobrepõe, por suas próprias qualidades artísticas, a desconsideração pela consideração, o não dito pelo dito, a coisa pelo sonho. Demora sobre o que passa. Mostra mais uma vez, que na arte como na vida o trabalho criador sempre abre caminhos inesperados para as aproximações desejadas; transfigura o inóspito em social; mostra urbanidade a metrópole”.
Texto de Flávio Motta para Folha de São Paulo
Sob as luzes da cidade
Como a diversidade molda a arte contemporânea combinando gêneros, técnicas e estilos das mais variadas expressões, obviamente, o mesmo fenômeno se verifica no trabalho dos artistas. A mostra de Gregório Gruber, na Galeria São Paulo, demonstra a liberdade do autor em expor-se, exibindo a busca, tateando a representação dos seus inúmeros olhares sobre o mobiliário arquitetônico, exterior e interior. O vocabulário plástico do autor pauta-se em volumes e cores sobre a paisagem urbana de São Paulo, Barcelona, Roma, que se desdobram em variáveis óticas, transformadoras e enriquecedoras de 12 pinturas com apreciáveis proporções. Os apontamentos gráficos, registros fotográficos e de memória, transportados às telas, com técnicas diferenciadas, criam estilos, ora tendentes à simples figuração da paisagem, ora com características construtivas. As formas da arquitetura dos exteriores resgatam as origens geométricas, fruto sem dúvida, do olhar distanciado do artista sobre o mobiliário, como no caso da tela Major Sertório, 1992. As vistas do Pacaembu, 1993, e Barcelona, 1989, montadas com discreta plasticidade matérica alcançam pujança cromática de mãos de mestre, através do jogo das transparências, das luzes. As pinturas e os nove pastéis vibrantemente coloridos, pastados com nervosa e impulsiva gestualidade pictórica, ressaltam o perfil de uma obra romântica que faz bem à alma, aos olhos e principalmente à própria arte brasileira, tão carente de objetivos sinceros e de firmeza profissional. Gregório faz, também, uma devassa nos próprios recursos potenciais, realizando projetos escultóricos, do figurativo real, bem ao gosto dos ingleses, caso da Figura feminina, 1992, ao abstrato-geométrico, Nascente, 1992. O experimento Barcelona, 1991, em vidrotil, busca, sobretudo no material, a capacidade da representação da luminosidade das cores a serviço da composição plástica. Esse universo variado, baseado nos fazeres artísticos multidisciplinares, revela a postura descontraída do artista, refletindo o seu tempo, em busca de outras formas de expressão. Trata-se de um artista que acredita na arte que faz. RADHA ABRAMO Revista ISTO É, 11/08/93
Radha Abramo – Revista Isto É, 11/08/93